Surgiram enormes parangonas em tudo quanto é sítio em Portugal em consequência do
reconhecimento pela UNESCO do Fado como património imaterial da humanidade .
Só que a candidatura e o seu subsequente reconhecimento não podem deixar de provocar
uma certa estranheza e dar lugar a algumas considerações atenta a excepcionalidade
quer da candidatura quer do reconhecimento .
É que a candidatura apresentada por Portugal foi tudo menos uma candidatura nacional -
foi, pura e simplesmente, uma CANDIDATURA REGIONAL ( a do Fado de Lisboa ), pois os
"cérebros" da candidatura excluiram a priori o Fado de Coimbra, lídima e bela expressão
sem a qual o Fado fica amputado na sua globalidade .
Aliás, as maldades em relação ao Fado de Coimbra não são de agora e, em especial na
Rádio Pública, são patentes e notórias - com a excepção, em raros momentos, do Edgar
Canelas, o Fado de Coimbra foi proscrito do éter . E o programa do Sansão Coelho no
Emissor Regional de Coimbra que, com profissionalismo e amor,divulgava o Fado de
Coimbra, foi pura e simplesmente silenciado .
Face a tais condicionantes surgiu agora uma candidatura regional do Fado de Lisboa, em
vez de uma candidatura nacional do Fado .
Mas é o País que temos, até nisto !
Na Colômbia, nos boletins de voto, para além dos locais normais com indicação dos candidatos, consta
mais uma linha na qual se pode assinalar, num quadrado, a opção " nenhum dos candidatos " .
Essa opção significa votar em branco, por não se rever o eleitor em qualquer das opções disponíveis .
Recentemente em Bello, no noroeste da Colômbia, aconteceu um acto eleitoral de enorme significado .
Depois de grande controvérsia, provocada pela recusa ( justificada ou infundamentada ? ) de algumas
candidaturas, surgiu um grande movimento de opinião, defendendo o voto em branco .
Em consequência o candidato único, German Antonio Londroño Roldan, teve 43,29% dos votos, enquanto
56,7% dos eleitores votaram branco .
Consequência : o candidato não foi eleito e, mais do que isso, ao ser "derrotado" pelo voto em branco, não
teve a possibilidade legal de se apresentar à nova eleição .
Trata-se de uma solução que devia ser implementada em Portugal se e quando for revista a legislação eleitoral
criando círculos uninominais .
Mas a "mafia" que abarrota a Assembleia dita da república irá nisso ?
Há cerca de três meses foi eleito o advogado Domingos Quadé como novo Bastonário da Ordem dos
Advogados da Guiné-Bissau (OAGB ) .
A eleição concretizou-se numa segunda volta, em virtude de, na primeira, nenhum dos candidatos ter
obtido a maioria absoluta dos votos .
A OAGB preocupa-se - o que só pode merecer aplauso - em garantir ao seu Bastonário uma inatacável
e incontroversa representatividade .
Infelizmente a Ordem dos Advogados de Portugal desinteressa-se desse magno objectivo, não seguindo
também a prática da Ordem dos Médicos de Portugal, que rejeita Bastonário eleitos por simples maioria
relativa, obrigando à realização de uma segunda volta entre os dois candidatos mais votados .
Em consequência das suas regras eleitorais a Ordem dos Advogados de Portugal tem como Bastonário
de reduzida representatividade um advogado que é também um verdadeiro jornalista panfletário .
Nos últimos tempos temos assistido, como se se tratasse do fluxo e do refluxo das marés, a afirmações
muito críticas às benesses que a classe política foi, ao longo dos anos de "democracia", atribuindo a si
própria ( já os nossos avoengos, com a experiência obtida em muitos anos e a rica capacidade de análise
da realidade envolvente que possuiam, diziam que " a caridade bem entendida começa por nós proprios "
... ) e a canhestras tentativas de branqueamento formuladas por alguns ex-titulares de cargos públicos,
vindo, pressurosa e candidamente, renunciar, de forma que pensam magnânima, a tais prebendas .
Só que as renúncias, indicadoras de uma postura apenas reactiva, surgem tarde para garantir a credibilização
da classe política .
Essa credibilidade, tornada cada vez mais necessária, teria sido sim alicerçada através de uma atitude
pró-activa dos potenciais beneficiários das referidas benesses, não requerendo a atribuição das mesmas .
Mas isso foi o louvável comportamento de uma ínfima minoria dos políticos, enquanto que quase todos se
sentavam à "manjedoura" da qual pareciam ter saido mas onde, ao fim e ao cabo, se mantiveram, titulares
de direitos e dispensados de obrigações .
Mário Ramires escreveu no "Sol" que " os cargos políticos, em termos de salário-base, são mal pagos " .
A frase necessita de ser aprofundada e esmiuçada, uma vez que, por incompleta em vertentes indispensáveis,
não permite compreender as razões pelas quais nunca há falta de candidatos a lugares com remuneração
tão exígua ...
Em minha opinião os políticos portugueses estão muito longe de ser mal pagos, uma vez que :
a) ser político é um INVESTIMENTO que se tem revelado altamente rendível, não apenas pelas portas que
abre para o DEPOIS como também por possibilitar a feitura de leis elaboradas à medida de certos interesses,
não poucas vezes inconfessáveis e garantes de compensações ;
b) muitos políticos - maxime os deputados - conservam o núcleo central das suas anteriores actividades
profissionais, pelo que o seu "sacrifício" em favor do povo se revela um PART-TIME muito razoável .
Por tudo o que refiro manifesto-me muito mais de acordo com Fernando Madrinha quando escreveu no
"Expresso" que " a política é quase sempre um tampolim para os servidores do povo darem um salto de
gigante nas suas vidinhas " .