Manuel António Pina deixou-nos . Partiu sem alarido, com a mesma discrição que sempre praticou
na vida e que era inversamente proporcional ao fulgor do seu talento, em especial o poético .
Eu, poeta obscuro que tanto o admirava ( com uma confessada pitada de inveja pelo seu engenho ),
penso que a melhor forma de o recordar, homenageando-o, consiste em transcrever um dos seus
belíssimos poemas . A dificuldade foi escolher ...
" A um Jovem Poeta
Procura a rosa .
Onde ela estiver
estás tu fora
de ti. Procura-a em prosa, pode ser
que em prosa ela floresça
ainda, sob tanta
metáfora ; pode ser, e que quando
nela te vires te reconheças
como diante de uma infância
inicial não embaciada
de nenhuma palavra
e nenhuma lembrança .
Talvez possas então
escrever sem porquê,
evidência de novo da Razão
e passagem para o que não se vê . "
in " Nenhuma Palavra e Nenhuma Lembrança "
Descanse em paz, Manuel António Pina . Nós continuaremos, enquanto por cá andarmos, a usufruir
das maravilhas que nos ofertou .
A atribuição do Prémio Nobel da Paz à União Europeia recebeu um coro de loas quase generalizado,
mas também - honra lhes seja ! - algumas criticas fundamentadas .
Entre estas conta-se a do Presidente da República Checa Vaclav Klaus, cuja primeira reacção foi a de
pensar que se tratava de uma brincadeira, aditando em seguida que a concessão a uma instituição
burocrática como a U.E. não tinha o menor sentido .
Comungamos por inteiro dessa opinião .
Com efeito, paz não é apenas ausência de guerra, devendo ser muito mais do que isso : entendimento,
concórdia, participação ( empenhada e construtiva ) e mesmo estima .
Ou seja, tudo aquilo que, no momento actual, não existe na U.E., que é um grupo de 27 países, dirigido
... por um país e meio, directório esse promotor efectivo, embora encapotado, de uma Europa a duas
velocidades( ou talvez mesmo a três se aos países do Sul e ao Cavalo de Troia Europeu do Reino Unido
juntarmos os Países do Norte e os restantes de maior dimensão e/ou mais desenvolvidos ).
Mas, apesar disso, não se justifica admiração pela concessão do Prémio Nobel da Paz à U.E., pois o
Comité Nobel já nos habituou a deliberações que ninguém entende .
E nestas, para além do Nobel da Paz a Barak Obama, recordo também a concessão do Nobel da Literatura
a Winston Churchill .
O dr. Mário Soares ( esse velhinho que nunca mais se cala, apesar de, no passado, ter chegado a
dizer que era preciso dar lugar aos novos ... ) escreveu um artigo no Diário de Notícias do dia 9 de
Outubro de 2012 no qual, entre outras "pérolas", afirmava que o Governo estava moribundo e que
Paulo Portas não pode continuar a ser Ministro sem perda total da sua dignidade e prestígio, também
o aconselhando a demitir-se o quanto antes .
Ora esse Mário Soares é o mesmo que, sendo 1º Ministro, assinou, em Agosto de 1983, um memorando
de entendimento com o FMI .
Os sacrifícios impostos nessa altura aos portugueses foram brutais .
Mas Mário Soares defendia esses brutais sacrifícios dizendo entre outras muitas coisas o seguinte :
* Os problemas económicos em Portugal são fáceis de explicar e a única coisa a fazer é apertar o cinto
( Diário de Notícias, 27 de Maio de 1984 )
* Quem vê, do estrangeiro, este esforço e a coragem com que estamos a aplicar as medidas impopulares
aprecia e louva o esforço feito por este Governo ( Jornal de Notícias, 28 de Abril de 1984 )
* Quando nos reunimos com os macroeconomistas, todos reconhecem com gradações subtis ou simples
nuances que a política que está a ser seguida é a necessária para Portugal ( idem )
* Fomos obrigados a fazer, sem contemplações, o diagnóstico dos nossos males colectivos e a indicar a
terapêutica possível ( idem )
*A terapêutica de choque não é diferente, aliás, da que estão a aplicar outros países da Europa bem mais
ricos do que nós ( Rádio Televisão Portuguesa, 1 de Junho de 1984 )
* Portugal habituara-se a viver, demasiado tempo, acima dos seus meios e recursos ( idem )
* O importante é saber se invertemos ou não a corrida para o abismo em que nos instalamos irresponsavelmente
( idem )
* Anunciámos medidas de rigor e dissemos em que constituia a política de austeridade, dura mas necessária,
para readquirirmos o controlo da situação financeira, reduzirmos os défices e nos pormos ao abrigo de
humilhantes dependências exteriores, sem o que o pais caminharia, necessariamente, para a bancarrota e o
desastre ( idem )
* Pedi que com imaginação e capacidade criadora o Minstério das Finanças criasse um novo tipo de receitas,
daí surgiram estes novos impostos ( 1ª Página, 6 de Dezembro de 1983 )
* A CGTP concentra-se em reivindicações políticas com menosprezo dos interesses dos trabalhadores que
pretende representar ( Rádio Televisão Portuguesa, 1 de Junho de 1984 )
* A imprensa portuguesa ainda não se habituou suficientemente à democracia e é completamente irresponsável .
Ela dá uma imagem completamente falsa ( Der Spiegel, 21 de Abril de 1984 )
* A Associação 25 de Abril é qualquer coisa que não devia ser permitida a militares em serviço ( La Republica,
28 de Abril de 1984 )
* As finanças públicas são como uma manta que, puxada para a cabeça, deixa os pés de fora e, puxada para
os pés, deixa a cabeça descoberta ( Correio da Manhã, 29 de Outubro de 1984 ) .
Realmente a senilidade é causa de inúmeros esquecimentos ...
Quando o Governo colocou a hipótese de mexer na TSU ( baixando a parcela patronal e aumentando
a imputada aos trabalhadores ), procurando reforçar a competitividade da nossa economia, em especial
no campo das exportações, as críticas foram quase unânimes .
Surgiram de onde eram mais do que espectáveis - vozes de esquerda, associações sindicais e trabalhadores
em geral - mas também de onde menos se esperariam - associações patronais e empresários em geral, com
raras e honrosas excepções .
Mas será que a hipótese estudada pelo Governo era abstrusa e inaceitável ?
Pareceu-me sempre que talvez não fosse assim e agora, depois de ter conhecimento de que François Hollande
( cujo posicionamento político não deixa dúvidas ) se encontra a estudar a aplicação em França de uma solução
bastante semelhante, só tenho razões para reforçar essa minha muito preliminar impressão .
Continuo a achar lógica e natural a posição de contestação das associações sindicais e dos trabalhadores em
geral .
Continuo a não compreender as críticas das associações patronais e da generalidade dos empregadores .
Ou talvez compreenda, embora por uma razão que ainda não vi expendida mas que, se calhar, terá alguma
razão de ser .
Será que os empresários, embora gostassem da medida, "temeram" manifestar-se a favor, com receio de uma
enorme reacção dos trabalhadores ?
Ou dito de outro modo : será que a recusa dos empresários é, mais do que outra coisa, demonstrativa de
falta de coragem para lidar com o "tsunami" reactivo dos trabalhadores e das suas organizações representativas ?
Tenho imensa curiosidade em relação aos desenvolvimentos que venham a ter lugar em França .
Desde já o encontrar-se a medida em estudo comprova que não é considerada tão estapafúrdia quanto isso .
António José Seguro, na noite de 5 de Outubro, tirou da cartola um coelho com algum interesse, ao
declarar que, até final do corrente ano, o PS iria apresentar na Assembleia da República um projecto
tendente à redução do número de deputados .
Com essa declaração somou alguns pontos :
1º - comprometeu-se pouco, uma vez que não quantificou o objectivo .
Redução do número de deputados para quantos ? 225 ? 181 ?
A montanha irá parir um rato ou algo mais significativo ? ;
2º - introduziu não um grão de areia mas um pedregulho na engrenagem da actual coligação .
É sabido que o CDS, com o síndroma do " partido do táxi ", nem quer ouvir falar em redução do
número de deputados, realidade na qual os extremos do tabuleiro político português se encontram
do mesmo lado da barricada .
E assim, como quem não quer a coisa, António José Seguro acendeu a mecha que conduz ao explosivo,
ficando, com tranquilidade, a observar os esforços do PSD para a apagar .
Não deixa de ser política rasteira, mas não deixa também de ser uma atitude inteligente .
No dia 5 de Outubro decorreram duas comemorações, de sentido, alcance e simbolismo muito diversos .
Na comemoraçao do 5 de Outubro de 1910 é invocado o derrube da Monarquia por um regime republicano
que se instalou pela força e só admite essa mesma via para sair de cena ( a antidemocrática Constituição
Portuguesa impõe, mesmo que não se queira, o sistema republicano de governo, não seguindo os exemplos
aplaudíveis das Constituições de Espanha, Luxemburgo, Bélgica, Holanda, Suécia, Dinamarca e Noruega que
não impõem ao povo a Monarquia ) .
E o que se comemora recordando o 5 de Outubro de 1910 ?
A retirada do direito de voto a centenas de milhar de portugueses, a retirada do mesmo direito às mulheres
chefes de família, a reintrodução da pena de morte, se bem que limitada a crimes militares ( a pena de morte
tinha sido abolida na Monarquia, o que mereceu o aplauso de grandes figuras europeias, como Vitor Hugo ),
a maior repressão sindical alguma vez ocorrida em Portugal ( em 1911 foram até assassinados grevistas pela
GNR ), o silenciamento brutal dos órgãos de informação não afectos ao novo regime e muitas outras malfeitorias .
Acresce que a comemoração este ano feita foi secreta, impedindo a presença do povo( se é que alguém do povo
estaria interessado em comparecer ... ).
E nela vimos um Presidente da República a passar ao lado da maioria dos problemas que amarguram os portugueses .
E um Presidente da Câmara Municipal de Lisboa a proferir um discurso lamentável, ao qual farei referência mais à
frente .
Em contraponto o 5 de Outubro de 1143 ( Tratado de Zamora, embrião da Nação Portuguesa ) foi comemorado no
Palácio da Independência, numa cerimónia na qual entrava quem quisesse .
O Senhor Dom Duarte Pio, Duque de Bragança e Legítimo Representante da Coroa, falou nessa cerimónia, com a
elevação, o patriotismo, a dignidade e o sentido de Estado e da Portugalidade que é apanágio dos Reis .
No final da cerimónia, ao ter a honra insigne de cumprimentar e saudar o Senhor Dom Duarte Pio de Bragança,
disse-lhe que " os republicanos realmente estão a fazer imenso pela Monarquia . Ainda hoje ouvi, pela rádio, o
discurso do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, dircurso próprio de um comício eleitoral " .
Tal como previ no post de 13 de Setembro transacto a Fase C do Projecto Gaspar efectuou uma
" lipoaspiração mínima " nas gorduras do Estado .
Continua a " carregar-se " nas classes média ( em rápida extinção ) e média-baixa e dão-se algumas
" bicadas " nos rendimentos dos mais abonados ( mas nada que se compare com a taxação fiscal de
França para esse grupo privilegiado ), mas onde efectivamente havia muito para cortar nada se
anuncia - e assim se conservam as mordomias dos políticos e o número exagerado de deputados, se
deixam incólumes as mais de trezentas Câmaras Municipais ( e não surge um novo Mouzinho da
Silveira ! ), se assiste ao sorvedouro de certas empresas públicas, se " respeita " o poderio de uma
intocada EDP, se recuperam " migalhas " nas PPP, etc., etc.
E não basta dizer, como Paulo Portas em 4 de Outubro de 2012, que " há que fazer um trabalho
significativo, redobrado, para encontrar as medidas de redução de despesa sobretudo do Estado
consigo próprio que permitam moderar ou aliviar a carga fiscal ", quando ele próprio e o seu pequeno
partido, por exemplo, são contra a revisão da legislação autárquica e a redução do número de deputados .
Enfim, uma chocante falta de coragem para cortar a direito e actuar onde é mais imperioso e necessário .
Uma tristeza !