Na sequência dos tristes acontecimentos ocorridos na Praia do Meco levantaram-se inúmeras
vozes zurzindo com brutalidade as praxes académicas, como se elas fossem todas iguais .
Só que não são .
Uma coisa é a praxe de uma Universidade histórica como a Universidade de Coimbra, com
tradições enraizadas durante séculos e outra coisa são os "arremedos" de praxe de "Universidades
de aviário" ou "Universidades de vão de escada" que não têm história nem tradições e que, por
isso mesmo, criaram à pressa e de uma forma não estruturada um pseudo código de praxe gerido
de forma arbitrária por estudantes seniores que nada fazem de positivo na integração dos novos
universitários .
Por minha parte continuo a recordar com imensa saudade a minha vivência coimbrã . Desde a
assinatura, como veterano, dos decretos da praxe - assinatura em latim macarrónico como Carolus
Emmanuelis Fariae Almeideque Sanctis -, ao Orfeão Académico e aos momentos especiais ( queima
do "grelo", as latadas, as fitas largas, o Cortejo, o Sarau e a Garraiada da Queima das Fitas, a
cartola ) .
E assinalo em especial - para provar aos zurzidores da praxe que esta tem, quando bem praticada,
claras finalidades de integração dos "caloiros" - o meu momento da queima do "grelo" antecedendo
as fitas largas do último ano do curso .
A queima do "grelo" tem lugar num penico, penico esse transportado por um "caloiro" ( escolhido
pelo "doutor" ) ...seleccionado através de provas de elevada complexidade ...
O meu processo de selecção consistiu em colocar o "caloiro" frente a frente com o seguinte tema :
" A influência das questões transactas nos casos correlativamente hipotéticos " .
Disse então ao "animal" que tinha trinta minutos para me apresentar um texto que tivesse elaborado
a propósito do referido tema .
E a verdade é que o "caloiro" se "desenrascou" muito bem, pelo que foi por mim escolhido para portador
do penico a utilizar na queima do "grelo" .
Este contacto inicial com a vivência académica coimbrã foi por certo um sedimento importante para o
subsequente percurso escolar desse recém-chegado à Lusa Atenas .
E penso até que o trabalho realizado no desenvolvimento do tema que lhe apresentara pode, quiçá, ter
tido alguma influência na especialidade que veio a ser escolhida no Curso de Medicina do qual o "animal"
era "caloiro" - acabou por tirar a especialidade de Psiquiatria .
E digam agora os zurzidores das praxes ( que, muito provavelmente, pensam assim por nunca se terem
inserido na inigualável vivência coimbrã ) se eventos como aquele que - com imensa saudade - aqui deixo
descrito devem ser erradicados da vida universitária .
O que sucede é outra coisa : não é legítimo comparar alhos com bugalhos ou seja Coimbra com outras
comunidades escolares que muito teriam a aprender com ela .
ÉFE-ÉRRE-Á !
O Partido pelos Animais e pela Natureza ( PAN ) lançou uma petição para proibir a disciplina de voto
na Assembleia da República em questões que não constem do programa eleitoral, considerando
que nesse caso a disciplina de voto reveste natureza inconstitucional .
Argumenta o PAN com o disposto no artº 155º da Constituição, que estipula a liberdade de exercício
da função de deputado .
Acrescenta o PAN que os deputados, apesar de eleitos por um partido, representam em primeira
instância os cidadãos que os elegeram .
O PAN refere ainda que, com o grave precedente aberto na votação do referendo da coadopção e
da adopção por casais do mesmo sexo, podem, no futuro, lobbies dos mais diversos tipos, sejam
económicos, políticos ou sociais, fazer pressão sobre os deputados ou as bancadas parlamentares
para que votem contra a sua consciência .
Estamos perante mais um caso da construção de um edifício pelo telhado .
É que os deputados só representarão, em primeira instância, os cidadãos que os elegerem se passarem
a ser eleitos em círculos uninominais, uma vez que apenas assim os eleitores ficarão cientes de forma
indiscutível de qual o parlamentar que tem assento na Assembleia da República em consequência do
seu voto .
Comece-se, portanto, a revisão do sistema eleitoral pelo princípio, tanto mais que só desse modo
será possível inverter o descrédito que, de forma progressiva, se vem instalando e é responsável por
uma abstenção e uma opção pelos votos brancos e nulos sempre em crescendo .
Não vejo, por outro lado, que a proibição da disciplina de voto torne, por si só e como por um passe
de mágica, menos viável a acção de lobbies desta ou daquela natureza .
A maior imunidade à pressão de lobbies não resultará nunca da liberdade de voto ( até pode acontecer
exactamente o contrário ) mas sim de uma honestidade sem mácula dos parlamentares .
Em 11 de Dezembro de 2013 escrevi neste blogue um texto com o título de " A circular do Conselho
Geral da Ordem dos Advogados de 3 de Dezembro de 2013 ... feita com os pés ", texto no qual
transcrevia uma carta dirigida ao dr. Marinho e Pinto, na altura ainda Bastonário da Ordem dos
Advogados .
Terminava essa carta referindo a " fase de despedida do Senhor Bastonário, em preparativos,
segundo consta, para uma vida regalada entre Bruxelas, Estrasburgo e Portugal " .
VOILÀ !
Acaba de ser anunciado que Marinho e Pinto é cabeça de lista do MPT ( Movimento Partido da
Terra ) às eleições europeias .
Bruxo !
P.S.
No anúncio da candidatura Marinho e Pinto foi interrogado sobre uma eventual candidatura à
presidência da república ( intencionalmente em minúsculas ), tendo retorquido que, como faltam
ainda dois anos, avaliará essa hipótese na altura própria . Rejeitou, contudo,que o MPT seja uma
espécie de " barriga de aluguer " para outros voos .
Quanto a este ponto limito-me a comentar que a república ( de novo intencionalmente em minúsculas )
anda com efeito pelas ruas da amargura ... mas tanto não ...
Até os croissants comprovam que o Papa Francisco e o Presidente François Hollande não são
originários da mesma cepa .
O Papa Francisco, há algumas semanas atrás, provocou grandes preocupações à segurança
do Vaticano que não conseguia lobrigá-lo na altura da refeição matinal .
Depois de alguns momentos quase de pânico os homens da segurança lá verificaram que o
Papa se estava a deslocar pelos jardins a caminho da residência de Bento XVI para lhe levar
alguns croissants quentinhos, acabados de sair do forno .
A história dos croissants de François Hollande é muito diferente e em vez de ser uma história
de simplicidade, de ternura e de afabilidade é uma história de sordidez e de falta de sentido
de Estado .
François Hollande, multiplicador de mulheres talvez em virtude de a França se encontrar num
lamentável e acelerado processo de islamização, deixava, na calada da noite, o Eliseu, onde
permanecia a "primeira-dama" e, disfarçado e transportado por um segurança pago pelos
contribuintes franceses, dirigia-se para a residência da "segunda-dama" onde passava a noite .
No dia seguinte, pela manhã, o segurança ( pago pelos franceses ) ia adquirir croissants
quentinhos, acabados de sair do forno ( pagos também pelos franceses ? ), croissants esses
que depois levava aos pombinhos .
Croissants que são assim testemunhos límpidos de comportamentos bem diferentes - louvável
e prenhe de ternura o do Papa ; chocante e indigno o do Presidente da França .
As minorias desejosas da criação de violência e de desordem bem reclamam da passividade do
nosso povo, alcunhando-o de abúlico e de resignado em excesso perante as enormes dificuldades
que lhe estão sendo impostas .
Só que esse comportamento não é apenas de agora, pois já se manifestava quando a gestão dos
políticos se encontrava nos antípodas da actual ou seja quando se gastava à tripa forra o que se
tinha e o que não se tinha ( em especial este último ... ), numa descarada e criminosa fuga para
a frente, como se o futuro não estivesse a ser hipotecado por décadas .
Também nessa altura o nosso povo se mostrava mais resignado do que crente, mais passivo do
que eufórico .
Talvez por ter bem presente que é enorme a sua capacidade de adaptação às conjunturas mais
diversas, encontrando sempre alternativas para minimizar os impactos negativos que ciclicamente
- em virtude de haver sempre que pagar ( e muitas vezes com língua de palmo ) os excessos
cometidos - lhe são impostos .
E não apenas isso : é que, mesmo em situações dramáticas como a presente, o sentido de humor
do nosso povo nunca falece, antes parecendo que é o "Viagra" recuperador de um estado de
espírito positivo .
Daí terem surgido recentemente alguns pensamentos bem humorados, dos quais vou recordar
apenas dois .
1º - Os pensionistas portugueses estão, em suas casas, a optar por uma alternativa frequente
entre os clientes da indústria hoteleira - estão a viver em regime de MEIA PENSÃO .
2º - Conversa entre dois amigos
* A austeridade actual é muito pior do que um divórcio !
* Explica lá isso, que eu não percebo o teu raciocínio .
* Tenho o meu património reduzido a metade e a minha mulher ainda está lá em casa !
Bendita capacidade de brincar até no meio das maiores dificuldades .
Não há dúvida de que o nosso povo vai ser capaz de dar a volta à crise que não o tem poupado .
Preocupante é se, alguns anos depois - como, infelizmente, tem sempre sucedido -, os nossos
incompetentes políticos ( estes ou os que lhes venham a suceder ) voltam a borrar a pintura .
O brutal, por inesperado, falecimento de Eusébio provocou em Portugal - e também em todo o
mundo - um sentimento unânime de comoção e de desgosto, como de nenhum modo recordo
ter acontecido antes .
Unanimidade uma vez que nem clubismos, nem regionalismos, nem credos, nem grupos etários,
nem sexos apresentaram fissuras, todos juntos no mesmo desgosto profundo .
Corrijo, uma vez que lamentavelmente não houve unanimidade .
É que Mário Soares, prosseguindo no seu chocante declínio, declarou de forma textual o seguinte :
" Era um homem bom, era um homem agradável e com pouca cultura mas evidentemente não
estava à espera que ele fosse um pensador . Estava à espera que ele fosse um grande futebolista
e isso ele foi . Foi um grande futebolista e uma pessoa bem formada . (...) Fui uma ou outra vez
com ele almoçar naqueles restaurantes onde ele comia ... ele almoçava num e jantava noutro era
assim uma coisa e tive ocasião de falar com ele algumas vezes e era sempre um homem interessante
e muito agradável . (...) Por isso não sabia nada que ele estava doente . E sabia que ele bebia muito
whisky, todos os dias, de manhã e à tarde . Isso eu sabia mas julguei que isso não lhe fizesse assim
mal . Foi para mim uma surpresa . "
São declarações execráveis, mas não estranháveis em Mário Soares .
O passado de Mário Soares não engana :
* exilado em França em 1970, após garantir a sua sobrevivência económica como "consultor" do
capitalista Manuel Bullosa, situação que só revelou em 1983 ;
* "um pobre vaidoso sem uma verdadeira noção dos acontecimentos históricos em que participava"
(Tony Benn );
* tem a falta de modéstia que todos lhe conhecem ;
* a ruptura com o PCP deu-se com os incidentes do 1º de Maio, por não lhe ter sido possibilitado
entrar na Tribuna do Estádio com o mesmo nome, para ficar ao lado de Costa Gomes, Vasco Gonçalves
e Álvaro Cunhal ;
* na Conferência " Europa Connosco", realizada no Porto em Março de 1976, fez fortes diligências no
sentido de que nela não falassem Salgado Zenha e Felipe González ;
* em 1976 optou por governar sozinho, recusando efectuar um acordo com o PSD, por pensar que
Ramalho Eanes, eleito Presidente da República, estaria sempre perante ele como um aluno aplicado
( bem se enganou, tendo até vindo a confessar, em entrevista ao Diário de Notícias a 2 de Abril de
1979, não ter sido a pessoa mais adequada para chefiar o 1º Governo Constitucional ) ;
* sempre gostou de ser bajulado pelos "fiéis", despromovendo e demitindo os que começassem a
dar muito nas vistas ;
* em 1980 o sério e impoluto Salgado Zenha não considerava Mário Soares competente para dirigir
com seriedade e rigor o PS ;
* tratava alguns componentes do Secretariado do PS ( Sampaio, Guterres, Constâncio, Sousa Gomes
e os ex-MES ) como inimigos ;
* procurou ficar com os louros do rompimento com o PCP quando o primeiro socialista a fazê-lo ( em
Janeiro de 1975 ) foi Salgado Zenha, só tendo Mário Soares "acordado" para o efeito una quatro
meses depois ;
* preza o exercício sem pudor do poder absoluto, como lapidarmente Salgado Zenha apontou ;
* afirmou ter feito um indiscutível sacrifício para ser de novo 1º Ministro após as eleições de 1983,
esquecendo-se que afirmara em 1979 não estar no seu horizonte desempenhar de novo tais funções ;
* preparou o partido para a efectivação de um referendo interno para decidir se se concretizaria uma
aliança com o PSD, quando afinal já tinha tudo previamente combinado com Mota Pinto ;
* foi classificado por Rui Mateus ( tem duas faces : afável, solidário e generoso quando em momentos
de dificuldade ; arrogante, egocêntrico e autoritário quando tem o poder na mão ; o PS não passa de
uma empresa de Mário Soares ) e por José António Saraiva ( é um homem que, apesar das aparências,
me parece pouco disponível para os outros ; ama o povo teoricamente ) ;
* também Vitor Constâncio, enquanto SG do PS, chegou a dizer que Mário Soares tinha a finalidade
de o submeter à condição de uma espécie de assessor de Belém .
Muito mais era possível acrescentar e recordar, mas não vale a pena .
Todos sabemos que Mário Soares não admite que quem quer que seja tenha mais reconhecimento.
carisma e visibilidade do que ele - não tem amigos, só súbditos ou inimigos .
Doeu-lhe, por certo, ver que Eusébio, um futebolista ímpar e um homem bom, era reconhecido de forma
unânime como estando num pedestal muito acima dele .
Daí as declarações ressabiadas e execráveis que proferiu .
Tudo menos inesperadas, para quem conheça o seu mau fundo .
P.S.
Várias das referências ao carácter de Mário Soares constantes deste post foram "bebidas" no notável
livro de Rui Mateus ( Contos Proibidos - Memórias de um PS Desconhecido ) que é pena não se encontrar
disponível para muitos mais portugueses, pois a 1ª edição desapareceu num ápice e a editora ( Publicações
Dom Quixote ) aparentemente não terá tido coragem para a sua reedição .
O recente acórdão do Tribunal Constitucional sobre a convergência de pensões tem sido
amplamente comentado .
Henrique Monteiro manifestou a sua incapacidade de entendimento quanto ao princípio
da protecção da confiança que o TC considerou decorrente dos princípios do Estado de
direito democrático consagrado no artº 2º da Constituição - foi ler o artigo e não encontrou
lá o tal princípio da protecção da confiança .
Vital Moreira afirmou, sem sofismas, que o princípio da protecção da confiança " não tem
paralelo na jurisprudência constitucional comparada " e que as prestações públicas - que
são pagas pelos impostos de todos -, ao serem consideradas intocáveis, tornam-se uma
" manifesta desigualdade " . E, antevendo o que naturalmente se seguirá, adiantou que
" em matéria de carga fiscal não há protecção da confiança " .
Já João Vieira Pereira escreveu que " com esta Constituição já ficou provado que é impossível
cortar despesa e é fácil aumentar impostos " .
Luis Marques, por seu turno, alargou a análise à generalidade dos tribunais, considerando
ser neles que a batalha política se trava hoje em dia, tendo a esquerda descoberto um
inesperado filão : a paralização da acção governativa através do recurso aos juízes .
Por seu turno José António Saraiva, de modo contundentemente claro, opina que o TC
delibera no século XXI com os quadros mentais do século XIX .
Só que, no meu entender, a postura do TC não resulta de qualquer desfazamento temporal
- trata-se sim de uma defesa indirecta de um óbvio interesse próprio : a existência, em favor
dos seus membros, de um regime de pensões escandaloso, que não apresenta similitude
com nenhum outro em Portugal .
E dai o ataque à " medida avulsa, ad hoc, que se concretiza numa simples ablação abrupta
do montante das pensões ", " uma medida que não visa apreender o sistema de protecção
social na sua globalidade, perspectivando-o apenas de forma unilateral através da preocupação
de corte imediato nas pensões atribuidas pela CGA " .
Acrescentou ainda o TC que uma qualquer " solução justa " teria que ser aplicada " de forma
gradual e diferida no tempo ", tendo que ser " uma solução sistémica, estrutural, destinada
efectivamente a atingir a sustentabilidade do sistema público de pensões, igualdade proporcional
e solidariedade entre gerações " .
Com este acórdão o TC afastou o risco, teórico mas potencial, de um eventual " apetite " do
Governo visando anular ( ou, pelo menos, reduzir ) o escandaloso regime de aposentação de
que os juizes do TC beneficiam, uma vez que considerou só ser admissível, no plano da
constitucionalidade, uma solução global e abrangente .
Como uma reforma dessa natureza não se prepara em poucos meses, os juizes do TC respiram .
Só que, ao produzirem o acórdão que congeminaram, ganharam em causa própria mas não
isentam os trabalhadores da função pública e os aposentados e reformados de sofrerem cortes .
É, mais uma vez, o jogo do gato e do rato entre o Governo eo TC - como Vital Moreira lucidamente
referiu " em matéria de carga fiscal não há protecção da confiança " .
Daí já ter sido anunciado o alargamento da base de incidência da contribuição extraordinária de
solidariedade ( CES ) dos aposentados e pensionistas, bem como o aumento das contribuições
para a ADSE .
Só que isso deve preocupar muito menos os juizes do TC do que a defesa dos seus escandalosos
privilégios .